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Código Civil: condomínio pode proibir AirBnb em imóvel próprio?
Publicado em 14/06/2025 10:18
Notícias
Reprodução/Airbnb
Mudanças no Código Civil podem impactar quem trabalha alugando imóveis no Airbnb

 

Uma proposta de reforma no Código Civil, em discussão desde 2024, propõe mudanças na  regulamentação do uso de imóveis residenciais para locações de curta duração. O texto pode regulamentar uma discussão entre donos de residências e os condomínios, que se baseiam em leis diferentes para tratar do assunto.

projeto de lei ainda está em análise no Senado Federal, sem previsão de quando a mudança pode ser feita. A mudança nas normas pode impactar investidores e trabalhadores que vivem dessa renda.

Para entender o que  como a lei trata do assunto hoje e seus possíveis desdobramentos, o Portal iG entrevistou o advogado Vanderlei Garcia Jr, sócio do Ferreira & Garcia Advogados, especialista em Direito de Contratos e Doutor em Direito Civil pela USP.

Lei do Inquilinato

Homem em pé com fundo preto
Arquivo pessoal

Vanderlei Garcia Jr, advogado especialista em Direito de Contratos

"Essa modalidade possui características próprias que a diferenciam das locações residenciais tradicionais. Por exemplo, permite o pagamento antecipado do aluguel e dos encargos por todo o período contratado. Também é comum a aplicação de cláusulas específicas de vistoria, limpeza, consumo de utilidades e entrega do imóvel" , explica Garcia Jr.

Na prática, essa legislação serve de base para a atuação de plataformas como Airbnb e Booking, ao viabilizar juridicamente o aluguel temporário de imóveis. O contrato pode inclusive ser feito por pessoas físicas, para fins estritamente residenciais e por períodos curtos. 

O crescimento dessas plataformas tem causado dúvidas e conflitos sobre as regras, principalmente em condomínios, o que tem obrigado a Justiça e o Legislativo a reverem conceitos e criarem novas normas sobre o assunto.

Regras sobre o Airbnb

Apesar de terem os serviços garantidos pela Lei do Inquilinato, as plataformas de aluguel por curta temporada estão sujeitas à legislação em que os condomínios se baseiam.

As regras sobre condomínios está baseada no Código Civil (a partir do art. 1.331), que garante o direito de propriedade, mas com limites relacionados à função social, ao sossego, à segurança e à saúde dos outros moradores, aponta o advogado. Com isso, surgem conflitos entre o direito do dono de usar seu imóvel como quiser e o direito dos demais condôminos à tranquilidade e segurança.

"Hoje, a jurisprudência majoritária, inclusive do Superior Tribunal de Justiça (STJ), tem reconhecido que, embora o aluguel por temporada seja legal, os condomínios podem impor restrições à sua prática, desde que essas limitações estejam previstas na convenção condominial ou aprovadas em assembleia nos moldes legais" , afirma o especialista em direito de contratos.

Atualmente, na ausência de proibição expressa na convenção ou de deliberação válida, o proprietário tem o direito de alugar a residência por temporada, desde que respeite o regulamento interno, as normas de segurança e o dever de não perturbação do sossego.

Mudança no Código Civil

Projeto de Lei nº 4/2024, que integra a proposta de reforma do Código Civil, pretende ampliar a autonomia dos condomínios na regulação das locações por curta temporada, especialmente as realizadas por plataformas. A medida tem como objetivo esclarecer e fortalecer o poder das assembleias condominiais para restringir ou até proibir esse tipo de locação, o que pode alterar o atual equilíbrio entre o direito individual de propriedade e o interesse coletivo dos condôminos, observa Garcia Jr.

Atualmente, embora o Código Civil permita que a convenção condominial regule o uso das unidades, a falta de uma previsão específica sobre o aluguel por temporada tem gerado controvérsias judiciais. O projeto busca preencher essa lacuna legal, propondo a inclusão de dispositivos que permitam aos condomínios deliberar sobre a vedação ou regulamentação dessas locações em assembleia.

"Na prática, a reforma busca dar maior segurança jurídica aos condomínios, reconhecendo sua legitimidade para disciplinar, restringir ou até mesmo proibir a prática de locações por temporada, desde que respeitado o quórum legal e os direitos fundamentais dos proprietários" , diz o advogado.

Para ele, a proposta tende a impactar diretamente o mercado de aluguel por temporada e os modelos de negócio de plataformas digitais, exigindo maior atenção por parte de proprietários e investidores às normas internas de cada condomínio.

Por que o assunto gera polêmica?

 

O tema está desde o ano passado em discussão no Senado Federal
Jonas Pereira/Agência Senado
O tema está desde o ano passado em discussão no Senado Federal

A discussão se torna polêmica ao colocar em conflito direitos importantes: o do proprietário de usar livremente seu imóvel e o da coletividade condominial por segurança, sossego e privacidade.

A legislação atual não é clara sobre o assunto, já que foi criada antes da popularização dessas plataformas. Isso gera incertezas jurídicas e decisões divergentes nos tribunais. Enquanto alguns defendem que esse tipo de locação fere a natureza residencial dos condomínios, outros alegam que proibir a prática compromete o direito de propriedade e a renda de muitos proprietários, explica Vanderlei Garcia Jr.

A proposta de reforma do Código Civil busca resolver essa lacuna, mas já enfrenta críticas de ambos os lados, mostrando que o tema segue em debate e sem consenso.

Airbnb e Booking defendem o direito à locação por curta temporada

O especialista observa que as plataformas Airbnb e Booking.com têm adotado posições claras no debate sobre a regulamentação do aluguel por temporada em condomínios. O Airbnb, de forma mais ativa, defende que essa prática é legal e protegida pela Lei do Inquilinato, além de estar amparada pela Constituição, que garante o direito de propriedade e a liberdade econômica.

Em nota enviada ao iG, o Airbnb afirma que "proibir ou restringir a locação por temporada viola o direito constitucional de propriedade de quem aluga o seu imóvel" (confira abaixo a nota na íntegra) .

A empresa argumenta que proibir essas locações afeta a renda de milhares de brasileiros que dependem do aluguel temporário, como aposentados e autônomos. Para apoiar seus usuários, o Airbnb oferece orientação jurídica, materiais educativos e, em alguns casos, suporte legal em disputas com condomínios.

Já a Booking.com, embora mais discreta, também apoia políticas que favorecem a economia compartilhada, desde que respeitadas as regras locais.

Ambas as plataformas buscam manter seu modelo de negócio, baseado na descentralização da hospedagem e na geração de renda, mas enfrentam crescente pressão de legisladores, autoridades e moradores que pedem mais controle sobre esse tipo de atividade.

Portal iG tenta contato com o Booking.com para posicionamento oficiais sobre o tema. Esta reportagem será atualizada em caso de respostas.

Leia na íntegra a nota do Airbnb enviada ao Portal iG

"O Airbnb acompanha atentamente as discussões sobre a proposta de atualização do Código Civil e tem um histórico de trabalho com governos de todo o mundo, inclusive no Brasil, para estabelecer boas políticas e compartilhar boas práticas. O aluguel por temporada no Brasil é legal, regulado pela Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991). Proibir ou restringir a locação por temporada viola o direito constitucional de propriedade de quem aluga o seu imóvel. O Airbnb está comprometido a apoiar o crescimento econômico no Brasil, ajudando proprietários de imóveis a obterem renda extra ao se tornarem anfitriões na plataforma, participando ativamente da economia local com praticidade e segurança."

Fonte :- https://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2025-06-14/caso-airbnb-o-que-diz-a-lei-sobre-aluguel-por-curta-temporada.html

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